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18 de abril de 2010

Brincadeiras de bebê


       O primeiro ano de vida é cheio de descobertas e grandes mudanças. A criança passa de um estágio de total dependência do adulto para de relativa autonomia. Aparecem características de personalidade e são estabelecidas as primeiras relações com outras crianças, objetos e adultos. O tipo de interação que os adultos mantém com as crianças é determinante para o desenvolvimento saudável de novas aprendizagens.
A diversidade de estímulos e o efetivo interesse provocado nos bebês incentiva a aquisição de novas habilidades e importantes aprendizagens. Para tanto, a organização do espaço e a escolha dos materiais oferecidos são decisivos e tão importantes quanto a qualidade da interação entre educadores e crianças. Segundo SOUZA (2002, p. 92) 

“nossos bebês podem realizar muitas coisas precocemente que, há meio século, não se imaginavam (experimentar com intenção, crescer com múltiplos cuidadores, aprender com coetâneos...) mas com a condição de que haja, como coloca Bondioli e Mantovani (1998, p. 28) um contentor afetivo estável que seja cimentador e catalisador do processo de crescimento e da construção de sua identidade pessoal” (SOUZA, 2002, p. 92)
Souza aponta o papel fundamental do educador de catalisador do processo de crescimento. Ele é o principal responsável pelo desenvolvimento integral da criança no período em que está na instituição. Fazendo-o através de um olhar sensível que destaque as necessidades de cada criança, seus interesses, suas frustrações, tristezas, alegrias, prazeres e realizações. Moldando, assim, as atividades, os objetos oferecidos, as atitudes, os toques, as palavras e as experiências.
De acordo com SOUZA, (2002, p. 97) no trabalho com bebês é fundamental que se contemplem alguns eixos: o cuidar, a construção da identidade, a socialização e a autonomia e a ampliação da percepção e leitura de mundo.
O cuidar se reflete principalmente na construção da rotina e na qualidade das interações no dia-a-dia. Na observação constante das ações e reações dos bebês e na identificação sensível das suas necessidades. No Berçário 1 o estabelecimento de um ritmo e uma sequencia de acontecimentos é fundamental para o sentimento de segurança que o bebê precisa desenvolver. As experiências e atividades podem ser variadas, mas alguns momentos precisam dos seus rituais para localizarem a criança nesse tempo e espaço diferentes que é a instituição. Ainda segundo SOUZA (2002, p. 93)

 “estar cercado por uma situação que contemple a previsibilidade, a constância e o ritmo é oferecer condições para que, a cada dia, o bebê amplie suas possibilidades ‘criando uma cadeia que transforma em percurso – início, meio e fim – o que aparece para ele como caótico, como ações desconexas. Essa é uma didática do fazer, pois favorece a integração das experiências que estão na base dos mecanismos da apropriação cognitiva’"BONDIOLI e MANTOVANI, 1998, p. 32)
As frustrações tem papel fundamental no processo de construção intelectual, cognitivo e psicológico da criança. Elas proporcionam que as crianças entrem em contato com esses sentimentos que o acompanharão por toda a vida e a criança precisará desenvolver a habilidade de lidar com eles. Essa atitude interna não é fácil de desenvolver e exigirá uma ordenação de ferramentas e atitudes da própria criança para solucionar suas questões. O desenvolvimento dessa atitude implicará na criança a capacidade de lidar com qualquer situação constrangedora, de espera, de perda , de falha, enfim, todos os sentimentos negativos que ela inevitavelmente irá passar durante a vida. Para SOUZA (p. 96, 2002)


"é muito importante que a criança viva frustrações ou situações de falha durante os cuidados diários que recebe. Essas falhas ou frustrações é que vão proporcionar à criança a descoberta de que ela não é uma extensão da mãe, desenvolvendo a percepção de discriminação. Entre 6 e 8 meses a criança deverá ter vivido um número suficiente de frustrações que a permitirá grandes avanços emocionais e cognitivos, distinguindo pessoas que lhe são significativas e familiares de estranhos." (SOUZA, p. 96, 2002)
A construção da identidade, a socialização e a autonomia dependem, como já foi dito, da relação que os adultos constroem com as crianças. Dependem da confiança, da liberdade, das conversas, dos toques e afagos, do estabelecimento de limites, da permissão da frustração, da tentativa e erro, de desafiar a criança a alcançar objetivos e superar obstáculos pelo seu próprio esforço. Oferecendo as condições necessárias, o incentivo e a confiança suficientes para a criança ter coragem e vontade de experimentar e testar as possibilidades.
A ampliação da percepção e leitura de mundo acontece através de tudo que for disponibilizado de diferente à criança para explorar e conhecer. Esse processo deve ser pensado, analisado, observado e decidido com base nas observações de necessidades das crianças e identificação das habilidades que possam ser desenvolvidas respeitando o tempo, o ritmo e o interesse de cada criança.
A partir do 5º e 6º mês a criança passa a desenvolver rapidamente os movimentos, começa a sentar-se sozinha, em seguida experimenta tentar engatinhar, até dominar esse movimento para levantar-se segurando, até dar os primeiros passos. Segundo SOUZA (p. 94, 2002)


“No primeiro ano de vida, a ação é a essência do desenvolvimento infantil. Movimentar-se, mexer e ser mexido, tocar e ser tocado, é fundamental para que o bebê se conheça e vá construindo toda uma percepção sobre seu corpo (imagem corporal). Essas percepções básicas sobre ele vão sendo construídas e reforçadas por todas as variadas e múltiplas experiências vividas, como a amamentação, a manipulação de seu corpo para ser vestido, trocado ou banhado, o tipo de toque que recebe durante as brincadeiras ou nas mais variadas situações, no que o bebê percebe sobre o que o outro sente sobre seus corpo e o que ele produz. Além disso, o ser tocado, olhado, o movimento e a exploração permitem que o bebê perceba seu corpo com suas partes e limites integrando-os (esquema corporal). Através do movimento vai construindo conhecimentos, sua inteligência desenvolve-se e podemos dizer que sua atividade intelectual, nesse momento, será basicamente sensorial e motora, servindo de fundamento a toda a gama de atividades intelectuais posteriores.”
Sendo a atividade intelectual da criança nessa fase essencialmente sensorial e motora destaca-se a necessidade da construção de um projeto que privilegie essas áreas. Nesse momento a criança deseja experimentar tudo com o corpo, especialmente usando a boca, as mãos os ouvidos, o olfato e a pele do corpo. Ainda de acordo com SOUZA, (p. 94, 2002)

“do mesmo modo que o cego apreende o mundo pelo tato, o bebê fará o mesmo, só que, essencialmente pela boca. Através do que capta mamando e através dos objetos que leva à boca, ele descobre as coisas do mundo. Descobre que ele também é feito de coisas macias, duras, ásperas, moles, frias,... ao levar coisas à boca (e como leva!) aumenta seu repertório de informações, e há, ao mesmo tempo, prolongamentos de prazer! Sugar é extremamente prazeroso e necessário para o bebê”.
O universo de experimentações das crianças nessa fase é povoado de brincadeiras tanto corporais, individuais ou coletivas, com adultos ou com objetos, com materiais diversificados ou elementos naturais. Nesses momentos, inúmeras percepções e habilidades são desenvolvidas construindo nas crianças noções variadas de tempo, espaço, conceitos, e atitudes. De acordo com SOUZA, (2002, p. 97) por exemplo, “as brincadeiras de se esconder, de aparecer e desaparecer auxiliam a criança nessa percepção de retorno, aliviando as tensões do primeiro ano de vida e dando ao bebê controle sobre esse movimento que ainda lhe provoca ansiedade”. Essas e outras brincadeiras pensadas e orientadas desenvolvem diferentes habilidades nas crianças, que observadas com atenção demonstram sinais sutis de suas recentes conquistas.
Por esse motivo, é muito importante que os adultos em contato com as crianças, observem e registrem cada movimento, ação e reação da criança. Atitudes que podem sinalizar a construção de novas conquistas e aprendizados. O olhar na criança, a análise sistemática do seu desenvolvimento e a capacidade de identificar avanços são primordiais para a documentação do projeto. Projeto este que tem como objetivo principal a intenção de enriquecer as experiências da criança no mundo, promovendo o seu desenvolvimento através de conversas, brincadeiras, oferecimento de materiais de diversas texturas e cores. 
            Fernanda Mattiola Pompermaier.

Referências Bibliográficas:

BENJAMIN, W. “Reflexões: a criança, o brinquedo e a educação”.
BONDIOLI; MANTOVANI. Manual de educação infantil. Porto Alegre: Artmed, 1998.
GOLDSCHMIED, Elinor e JACKSON, Sonia. “Educação de 0 a 3 anos: o atendimento em creche.” Porto Alegre: Artmed, 2006.
OLIVEIRA, Zilma de Moraes Ramos de (org.). Educação Infantil: muitos olhares. 5.ed. – São Paulo: Cortez, 2001.
RAPOPORT, Andrea. Adaptação de bebês à creche. A importância da atenção de pais e educadores. Porto Alegre: Mediação, 2005.
SOUZA, Regina Célia de e BORGES, Maria Fernanda Silveira Tognozzi. A práxis na formação de educadores infantis. Rio de Janeiro: DP&A, 2002.
THEVENOT, Brigitte e NAOURI, Aldo. Conversando sobre bebês: do nascimento aos 3 anos. Bauru, SP: EDUSC, 2004.